Café-racer, um café com classe

Café-racer, um café com classe

 

Conheça a Triumph Boneville Street Cup 900

Os ingleses são peculiares. Inventaram o futebol, o chá das cinco e o conceito café-racer. Se os dois primeiros não existissem, não fariam a menor diferença na minha vida. Mas, café-racer, só por essa invenção, já posso apoiar a decisão de a Inglaterra se colocar como “uma ilha fora da Europa”, porque merece o status de mundo à parte.

Melhor do que criar um conceito é tomá-lo para si como embaixador e foi isso que a inglesa Triumph fez ao lançar a Boneville Street Cup, a partir das já clássicas Boneville. Confesso que torci o nariz quando vi o guidão baixo, que no meu tempo chamávamos de “morceguinho” (mas os bacanas chamam de “ace”) e o banco monoposto, com uma rabeta de plástico. Uma coisa, porém, que ninguém deveria fazer é julgar uma moto parada. É preciso andar nela! E foi o que eu fiz.

Gosto é uma questão 100% pessoal, mas ninguém passa batido pilotando uma Street Cup. Isso porque ela é muito charmosa e classuda, o que a deixa super adequada para aquelas pessoas que querem usar moto, mas não querem ficar com cara de “qualquer motoqueiro”. A versão amarela é muito bonita – mas infelizmente fui sorteado com a preta – e manda um recado sutil para uma das concorrentes, a Ducati Scrambler, tipo: cheguei!

Com um acabamento impecável, chamam atenção o painel com conta-giros analógico (como devem ser todas as neo-clássicas), a pequena carenagem de farol, os comandos muito bonitos e o guidão, que merece um comentário à parte. Destaque para o motor de dois cilindros paralelos, que manteve as aletas de arrefecimento, mesmo sendo arrefecida a líquido (só para manter o visual dos anos 60), assim como os corpos de injeção que se assemelham muito a carburadores.

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Quando eu comecei a pilotar motos, no começo dos anos 70, “herdei” do meu irmão uma Yamaha AS3 125. Uma das primeiras coisas que fiz foi colocar o guidão “morcego”, exatamente o mesmo formato que hoje equipa essa Triumph, só que agora tem algumas regulagens que ajudam a encontrar o melhor posicionamento de acordo com a altura do piloto. Esse tipo de guidão é a assinatura mais expressiva de uma autêntica café-racer, porque não exige tanta alteração na moto, basta substituir o original e pronto! Dá pra fazer em casa mesmo.

Assim que montei na Street Cup, de cara enfrentei um baita congestionamento. Adaptei-me rapidamente e, claro, rolou uma memória emotiva forte. Imediatamente, lembrei-me da minha Yamahinha 125, inclusive pelo tanque fino, em forma de gota. Na versão inglesa, as pedaleiras são ainda mais recuadas e o piloto fica inclinado para a frente, sem o exagero das esportivas puras, com semi-guidões fixados nas bengalas. Para um nano-motociclista como eu (1,69 m), a posição de pilotagem parece sob medida, mas os joelhos encostam na tampa do cabeçote. É preciso sentar mais afastado do tanque, porém, como ele é fino demais, fica difícil se segurar com os joelhos na hora da frenagem. Exatamente como as motos dos anos 60/70. Se eu tivesse uma moto desta, colaria aquelas borrachas laterais no tanque para dar mais volume e segurar melhor a moto com os joelhos. Certamente será oferecido como opcional. Aliás, essa é uma moto totalmente customizável e a lista de acessórios conta com 120 itens, inclusive aquecedor de manoplas.

Pelo menos o motor arrefecido a líquido não esquenta muito e preserva o conforto. Em termos comparativos, a Ducati Scrambler (my eggs) esquenta muito mais e gera certo desconforto.

Só não gostei dos espelhos colocados nas extremidades do guidão. Se eu comprasse uma, já mudaria isso antes de tirar da concessionária, ou mudaria de cidade, porque morando em SP é muito chato ficar tuc-toc-tuc batendo nos zilhares de retrovisores espalhados. Isso é fácil de resolver.

 

Música!

No percurso urbano, o pouco esterçamento do guidão dificulta um pouco para costurar entre os carros. Moro em SP e divido as ruas com seis milhões de veículos. Não é tão difícil ziguezaguear que nem uma minhoca, mas precisa sempre se lembrar que o guidão vira pouco, em comparação com uma trail ou utilitária. É perfeitamente possível usar essa Triumph na cidade, como meio de transporte, sem o menor problema, porque é uma delícia de pilotar.

O motor é um caso de amor à primeira partida. Silencioso, torcudo (8,2 Kgf.m a 3.230 RPM), sem vibrações excessivas, tem um ronco que parece música. Os escapamentos são mais grossos e curtos do que na Boneville Street Twin e só conseguia pensar numa coisa: como ficaria com escapes esportivos! Oh, céus!

Comecei o teste rodando muito na cidade, mantendo a capa do banco que a deixa ainda mais charmosa. Quem não gosta de usar mochila, esquece essa moto, porque não tem nem onde prender uma capa de chuva. Nem mesmo o guidão baixo incomoda. Os braços ficam bem dobrados e, até depois de uma jornada longa, não acusam cansaço. Diria que é uma moto para quem quer realmente usar no dia-a-dia e, não apenas, posar de modernoso.

 

Ainda no percurso urbano, foi possível sentir que as suspensões são bem calibradas, com dois amortecedores reguláveis atrás e bengalas na frente, todas da Kayaba, revelando que não existe frescura nacionalista quando o assunto é produzir uma boa moto. E deixe de ser Maria-vai-com-azoutras e ficar no mimimi “ah, mas não tem monoamortecedor…”, porque essa moto casou perfeitamente o estilo, além de comprovar a eficiência na prática.

 

Retas que te quero curvas

Duas medições que não realizo mais há décadas, são consumo e velocidade máxima. O consumo porque, depois da injeção eletrônica, só se consegue medir com aparelhos caros e complexos (medidor de vazão). Além do que, aquelas medições feitas enchendo o tanque, rodando e depois completando para descobrir quantos kms fez com um litro de gasolina, pode funcionar muito bem entre taxistas, mas tem nenhum rigor técnico.

Já a velocidade máxima também não serve pra nada e coloca o pescoço do testador (no caso, eu!) em risco. Hoje em dia, as fábricas divulgam (se quiserem) esses dados nas fichas técnicas. Mas, como sei que todo mundo vai perguntar, então lá vai: o consumo fica na casa de 22 km/litro (segundo a revista Motociclismo brasileira) e a velocidade máxima chutaria cerca de 185 km/h (segundo depoimentos dos fóruns ingleses, chegaram a 112 mph, o que dá 179 km/h).

Depois da tortura urbana, foi a vez do prazer das estradas. Só que incluí um adicional: uma garupa! Primeiro, convém destacar que a operação de tirar e pôr a tampa do banco é muito fácil, basta uma chave Allen! Segundo, saiba que esse espaço pra garupa é meramente decorativo, porque viajar ali é uma verdadeira prova de amor – ou desespero.

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Fiz o roteiro que usava nos tempos de testador de pneus, que dá cerca de 250 km, passando por uma estrada cheia de curvas, cidadezinhas com asfalto demolidor e auto-estrada de primeiro mundo. Logo de cara, já percebi que é preciso negociar bem essa divisão do banco, porque é um cocuruto que joga a pessoa da garupa para a frente, obrigando o piloto a espremer as partes no tanque, ou escorrega o traseiro para trás, correndo risco de sentar na lanterna traseira. Mesmo assim, para percurso curto dá até para dar carona a alguém, mas se passar de 100 km pode preparar a paciência.

No trecho sinuoso, sem acompanhante na garupa, pude deitar até onde o juizômetro permitiu. E foi bastante! Com pneus feitos exclusivamente para essa família de Triumph, o comportamento é melhor do que de muita naked com pretensões esportivas. Em relação à Street Twin, essa Street Cup tem o ângulo de cáster mais fechado, o que ajuda bem nas curvas de baixa e é um pouco mais alta justamente para deitar bastante sem raspar as pedaleiras muito cedo.

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Não senti nenhuma necessidade de freios mais fortes e acho mesmo que muitas motos que usam duplo disco na frente mostram um apelo mais de marketing. Com apenas um disco na frente e um atrás, essa Triumph segura muito bem sem sustos. Ela vem com ABS de série.

Já na parte da estrada mais reta, a posição de pilotagem é o grande destaque, porque faz o ar desviar por cima do capacete, sem dar a sensação de que a cabeça será arrancada do pescoço. Em velocidade de cruzeiro, de 120 km/h, o motor revela 4.100 RPM em quinta e última marcha. Alguns jornalistas gringos “reclamaram” da falta da sexta-marcha. Honestamente, eu não senti nenhuma necessidade, porque, nessa rotação, o motor é silencioso e vibra pouco. Ao contrário da maioria dos motores japoneses, essa Triumph não “pede” marcha e o indicador digital de marcha no painel se torna muito útil. Assim como o computador de bordo que informa, entre outras coisas, o consumo instantâneo e a autonomia com o tanque na reserva. Senti falta apenas do indicador do nível de gasolina. Pelo painel também se pode verificar a atuação do controle de tração (comutável) e se o ABS está ativo.

Um dos grandes baratos de pilotar essa inglesa é a impressionante retomada de velocidade. Deixei o motor cair a 1.800 RPM, em quinta, e acelerei só para sentir o vigoroso motor de 55 CV crescer de giro, sem nem pestanejar. O acelerador eletrônico ajuda bastante, porque não tem a folga do cabo. Enfim, uma moto inglesa, com o charme de antigamente, mas tecnologia atual.

 

Motor

Tipo: Arrefecido a líquido, 8 válvulas, SOHC, motor duplo paralelo com virabrequim de 270°

Cilindrada: 900 cc

Diâmetro x Curso: 84.6 mm x 80 mm

Potência máxima: 55 cv @ 5900 rpm

Torque máximo: 8,2 Kgf.m@ 3230 rpm

Alimentação: Injeção eletrônica multiponto sequencial

Marchas: 5 marchas

Transmissão Final: Corrente

Embreagem: Discos múltiplos, banhada a óleo

Quadro: Berço de aço tubular

Braço oscilante: Bilateral, aço tubular

Roda dianteira: Liga de alumínio fundido, 10 raios, 18 x 2.75 polegadas

Roda traseira: Liga de alumínio fundido, 10 raios, 17 x 4.25 polegadas

Pneu dianteiro: 100/90-18

Pneu traseiro: 150/70 R17

Suspensão dianteira: Garfo Kayaba 41 mm, curso de 120 mm

Suspensão traseira: “Twin shock” Kayaba com ajuste de pré-carga, curso de 120 mm

Freio dianteiro: Disco único de 310 mm, pinça flutuante Nissin de 2 pistões, ABS

Freio traseiro: Disco único de 255 mm, pinça flutuante Nissin de 2 pistões, ABS

Pacote de instrumentos multifuncional com velocímetro analógico, tacômetro

analógico, indicador de posição de marcha, medidor de combustível, autonomia, indicador de serviço, relógio, computador de bordo, preparação para manoplas aquecidas, consumo de combustível e mostrador de status do controle de tração.

Funções

Tanque de combustível: 12 L

Comprimento: 2.090 mm

Largura: 740 mm

Altura (sem espelhos retrovisores) 1.105 mm

Altura do assento: 780 mm

Distância entre eixos: 1.435 mm

Peso Seco: 200 Kg

Cáster/Trail: 24,3°/97,3 mm

Outras funções e benefícios: freios ABS, controle de tração, ride-by-wire, imobilizador, entrada USB e luz traseira em LED, como itens de série.

 

Fotos: Tite Simões, Miriam de Oliveira  e divulgação Triumph

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Emilio Camanzi

Emilio Camanzi

Emilio Camanzi  é um jornalista experiente e formador de opinião, com mais de 56 anos de trabalho dedicados a área automobilística. Seu trabalho sempre foi norteado pela busca da seriedade e credibilidade da informação. Constrói suas matérias de forma técnica, imparcial e independente, com uma linguagem de fácil compreensão. https://www.instagram.com/emiliocamanzi/ 🙋 PARCERIAS: comercial@carroscomcamanzi.com.br

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