O XR3 do tio e o conversível da vizinha

O XR3 do tio e o conversível da vizinha

 

Ainda me lembro com grande lucidez do dia em que meu tio Lito chegou na casa de meu avô Gerardo com seu carro novo. Não me lembro ao certo o ano, mas, salvo engano, era 1984. Isso! Era 1984 mesmo. O carro em questão era um Ford Escort XR3. Preto, com aerofólio, faróis de milha e neblina destacados, filetes vermelhos na linha da cintura e rodas de liga leve com “quatro gomos”.

Ele me chamou para dar uma volta naquela nave, que tinha bancos em camurça. Naquela época ninguém usava cinto de segurança e eu, no alto dos meus cinco anos, podia passear soltinho no banco da frente. Só não podia pisar no estofado e nem melecar o painel. Afinal, era uma voltinha rápida pelas ruas do Sagrada Família, bairro de Belo Horizonte, que se resumiria num percurso pela Conselheiro Lafaiete, Pitangui, Campestre e General Antônio Torres. Em 1984 só George Orwell fiscalizava a vida alheia. E olhe lá.

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A experiência foi bacana, pois o carro do meu tio contava com um toca-fitas que tinha uma diminuta tela de TV embutida. Era um mini televisor de tubo e eu fiquei fascinado em assistir o Papo de Bola do Cafunga no banco do Escort do tio Lito.

O XR3 já tinha pelo menos um ano de mercado e era o esportivo mais legal da praça. Afinal, naqueles dias, o Gol ainda usava motor de Fusca, o Chevette era um Chevette e o Uno ainda tentava convencer o consumidor de que não era um 147 bonitinho. Recentemente o Escort XR3 comemorou os 35 anos de seu lançamento na Europa (1982), chegando um ano depois ao Brasil. Ele marcou aquela geração Juba & Lula e ajudou muita gente a “se dar bem”. Era sonho de consumo.

Mas apesar do visual arrojado e toda perfumaria, o Escort XR3 estava longe de ser um puro-sangue, mesmo que seu desenho e apêndices aerodinâmicos fizessem clara menção à esportividade. Seu motor 1.6 de 83 cv, movido a álcool e carburado, era um velho conhecido dos clientes Ford e já equipava Corcel II, Del Rey e Belina. Cumpria bem o seu papel, mas estava longe de apresentar vigor olímpico.

Eu não sei que fim teve o XR3. É garantido que tio Lito não o capotou, mas não sei o que foi feito dele. Porém sabia que o velho nunca teve a menor dó de carregar o carrinho com tranqueiras e materiais de construção para levar para seu sítio. Vai ver que era por isso que ele nunca pendia para nenhum dos lados!

O segundo XR3 que me recordo com vivacidade (e virilidade), foi um conversível amarelo de uma vizinha de prédio lá no Gameleira. A jovem senhora loira era, sem dúvida, a mulher mais gata da rua e a paixão da molecada (em especial do Renato Zizi). Certamente teve contribuição indireta no desenvolvimento de toda a turma. Se é que você me entende!

Aquele XR3 rivalizava com a motorista, principalmente quando ela recolhia a capota do carro para fazer uma graça quando passava devagarinho pela rua, interrompendo nossa peladinha vespertina em pleno calçamento.

O XR3 dela era ano 1989, já com o desenho reestilizado e motor 1.8 de 99 cv que dava mais vigor ao carrinho da Ford. O mais legal daquele carro era o arco de proteção, uma espécie de santantônio, que servia de anteparo em caso de capotagem.

A maior alegria da molecada foi quando o marido da vizinha levou a turma para dar uma volta no Escort. Foi o máximo. Com o teto arriado, a meninada fez a festa. Subimos nos bancos, apoiamos no santantônio, sujamos o estofamento, tiramos sarro com todo o bairro, enquanto o bom vizinho fazia que fosse acelerar forte. Melhor seria se fosse a mesma guiando e com seus cabelos dourados esvoaçando.

Pouco depois o casal se mudou e depois disso o Escort perdeu a graça. Ainda mais com o surgimento do Gol GTI e do Kadett GSI. As gerações posteriores tinham um apelo mais funcional que emocional, mas, mesmo assim, foi um carro bacana, bem diferente dos nacionais pasteurizados e plastificados dos dias de hoje.

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Por Marcelo Iglesias Ramos

(Jornalista – (31) 99245-0855)

 

Fotos: divulgação

 

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Emilio Camanzi

Emilio Camanzi

Emilio Camanzi  é um jornalista experiente e formador de opinião, com mais de 56 anos de trabalho dedicados a área automobilística. Seu trabalho sempre foi norteado pela busca da seriedade e credibilidade da informação. Constrói suas matérias de forma técnica, imparcial e independente, com uma linguagem de fácil compreensão. https://www.instagram.com/emiliocamanzi/ 🙋 PARCERIAS: comercial@carroscomcamanzi.com.br