Nosso eterno vigilante rodoviário partiu para sua última missão

Nosso eterno vigilante rodoviário partiu para sua última missão

Seriado que deixou saudades para aqueles com mais de 60 anos de idade, O Vigilante Rodoviário invertia o dito popular: ao invés da narrativa imitar a vida, aconteceu o contrário. Já explico: o inspetor Carlos, interpretado por Carlos Miranda, acabou sendo incentivo para o ator se tornar um verdadeiro policial rodoviário. Nosso saudoso Vigilante Rodoviário partiu nessa semana aos 91 anos de idade, deixando triste o coração de muitos brasileiros que, assim como eu, cresceu assistindo os 38 episódios gravados da série, e ouvindo o jingle que tocava na abertura de cada história.

Nosso herói brasileiro representava um valente e bravo integrante da Polícia Rodoviária Estadual de São Paulo, enfrentando todo o tipo de bandido que estivesse trafegando pelas rodovias paulistas. Corria atrás deles com seu Simca Chambord ou com a moto Harley-Davidson, sempre acompanhado pelo seu fiel escudeiro, o cachorro Lobo, que também atacava a bandidagem. O interessante é que, depois do fim do seriado em 1962, Carlos Miranda, ainda iniciante na carreira de artista, ganhou tão pouco atuando na série e gostou tanto de viver um agente da lei que acabou concursando para, de fato, virar policial rodoviário em São Paulo.

Em 1965, depois de passar na prova de admissão, transformou-se no inspetor Carlos, indo parar na área de comunicação da Polícia Rodoviária Estadual paulista. Ficou lá até 1989, quando se aposentou (ou “reformou-se”, como dizem no meio), já com a patente de tenente-coronel. Uma alta graduação na corporação.

Na série, ele utilizava motos Harley-Davidson, sedans Ford importados ou então o famoso Simca amarelo e preto, nas cores da corporação. A Harley e os Ford eram emprestados pela própria Polícia Rodoviária, e o Chambord veio logo depois, cedido pela própria Simca (cinco unidades). Curiosamente, a corporação paulistana nunca utilizou Simca Chambord na sua frota de viaturas, mas sim os tais Ford norte-americanos e jipes da Willys. Uma pura jogada de marketing para promover o modelo da Simca, lançado cerca de dois anos antes no mercado nacional.

Na época, penaram com os Chambord, já que o carro era fraco (seu V8 2.4 era oriundo de motores Ford dos anos 30) e tinha problemas frequentes, como superaquecimento e a baixa durabilidade da embreagem. Era o que tínhamos para a época, início dos anos 60.

Quando se aposentou, no finalzinho da década de 80, o inspetor Carlos começou a participar de encontros de carros antigos e outros eventos do tipo. Para não ir de mãos abanando, comprou e reformou um Simca Chambord 1960, transformando aquele carro numa réplica das viaturas utilizadas no seriado. A bordo do sedan, ele ia aos encontros vestindo, inclusive, uma farda de policial rodoviário da época, que ele também mandou fazer. Após perder o tal carro restaurado num acidente em 2007, acabou recriando um outro Chambord, desta vez 1959, como a viatura do seriado.

Esse último Simca do vigilante rodoviário era o mais poderoso. O primeiro restaurado, perdido no acidente, havia recebido um motor quatro cilindros de Chevrolet Opala. Esse segundo já foi adquirido com um V8 5.1 Dodge acoplado ao câmbio de três marchas na coluna. Sem dúvidas, o lerdo sedan de projeto francês deve ter ficado bem rápido com o trem-de-força Dodge, e há quem diga que viu Carlos com seu Chambord V8 5.1 “fantasiado” de viatura a mais de 180 km/h por rodovias paulistas. Uma temeridade!

Mas, certamente, Carlos Miranda, ou “inspetor Carlos”, deixará saudades. Nascido no bairro da Mooca, em São Paulo, em 1933, sonhava com a carreira artística, e nunca pensou que seria um militar de alta patente, como de fato foi. Até a forma como chegou ao estrelato da série foi incomum, afinal, enquanto faziam inúmeros testes com possíveis atores para interpretar o policial rodoviário, Carlos trabalhava como assistente de produção. Após acharem que ele levava jeito para o papel, ele fez alguns testes e…pronto! Haviam encontrado o protagonista do seriado que o fez ser conhecido nacionalmente, ainda que o salário não fosse à altura.

Por essas e outras, Miranda acabou se interessando muito pelo ramo de vigilante rodoviário, e anos depois estava vestindo a farda de verdade, como profissional da corporação. História riquíssima e única. O inspetor Carlos não “morreu”, mas sim “partiu para sua última e eterna missão”. Nosso primeiro e inesquecível herói.

Veja também:

DEIXE SEU COMENTÁRIO

Douglas Mendonça

Douglas Mendonça

Douglas Mendonça é jornalista na área automobilística há 46 anos. Trabalhou na revista Quatro Rodas por 10 anos e foi diretor de redação da revista Motor Show até 2016. Formado em comunicação pela Faculdade Cásper Líbero, estudou três anos de engenharia mecânica na Faculdade de Engenharia Industrial (FEI) e no Instituto de Engenharia Paulista (IEP). Como piloto, venceu a Mil Milhas Brasileiras em 1983 e a Mil Quilômetros de Brasília em 2004. 🙋 PARCERIAS: comercial@carroscomcamanzi.com.br