Foi nesse cenário que fiz o teste da nova Ducati Monster 1200S que chega ao Brasil por R$ 59.900, moto que tenho um longo histórico de amizade. Quando chegou a primeira no Brasil, em 1993, eu estava lá, em Caxias do Sul (RS), na época que a Agrale representava a marca no Brasil, esperando ela sair da caixa de madeira. E ainda ajudei a ativar. Por isso fiquei bem contente de ser convidado para participar deste teste e logo de cara perceber que, visualmente, a Monster lembra muito aquela de quase 25 anos atrás.
Isso é uma coisa interessante nesta “famiglia” de moto. Ela se moderniza, mas respeita o visual original. A começar pelo tanque de gasolina, que lembra muito o das primeiras, com um formato arredondado e curvas suaves, quase sensuais. Além da característica original de ser basculante e fixado por uma presilha semelhante à dos carros de corridas dos anos 60. Esse detalhe vintage dá um charme especial à italiana.
As Monster tem outra característica marcante, presente em toda linha Ducati: o quadro de treliça tubular, também charmoso, que recebe o motorzão Testastretta 11º de dois cilindros em L, de exatos 1.198 cm3, capaz de desenvolver 152 CV a 9.250 RPM e o torque monstruoso de 12,8 Kgfm a 7.750 RPM. A parte interessante desse quadro é que o motor faz parte da estrutura que recebe também a suspensão traseira e a balança monobraço. Isso mantém a distância entre-eixos reduzida, que dá mais maneabilidade ao conjunto.
O que mudou?
Além da distância entre-eixos menor, toda a moto passou por um regime aqui e ali, que a deixou com magérrimos 185 kg. Começando pelo tanque de gasolina que ficou mais fino e perdeu um litro em relação ao modelo anterior, agora com 16,5 litros. Não fizemos medição de consumo, mas pode ficar tranquilo porque a autonomia é grande. O quadro foi todo redesenhado para deixa-la mais estreita, o que ajudou na pilotagem esportiva.
Uma das melhores notícias veio da eletrônica. Primeiro os freios, que agora contam com uma tecnologia (Bosch) que interpreta a posição da moto e distribui a frenagem entre as rodas dianteira e traseira em qualquer condição. Se a Monster estiver inclinada, a ação do freio dianteiro é reduzida e parte da frenagem vai para a roda traseira. Isso evita o “stand-up”, que nada mais é do que levantar a moto no meio da frenagem quando o piloto aplica o freio dianteiro com vontade.
Outra benção da eletrônica é o controle de tração. Trata-se de uma espécie de ABS, só que na função nova. O sistema compara a velocidade da roda com a rotação do motor e sabe se precisa atuar para evitar uma derrapagem. Graças ao sistema, é possível acelerar em piso de baixa aderência ou no meio da curva com a moto inclinada, que a roda traseira não escorrega. Por último e igualmente bem vindo, é o controle de empinada. Como tem gente que gosta de ver a roda dianteira no ar, esse controle tem oito opções, desde não empinar, até quase jogar o piloto pra fora do banco.
Tudo isso pode ser selecionado pelo piloto por meio de botões e do display digital do painel e gerenciado por uma central eletrônica. São três módulos básicos de pilotagem:
-Esportivo, que deixa toda a cavalaria à solta, mantém o sistema de freios no nível 2 (a traseira pode derrapar de leve), o controle de tração e o de empinada no nível 3, o que passa a sensação que a moto está soltinha, mas tem ainda muito controle à prova de erros de pilotagem.
-No modo Turismo, a potência se mantém a pleno, porém a entrega é mais progressiva. As atuações dos sistemas de tração e de freio ficam mais restritivas e o controle de empinada sobe para o nível 5.
-Já no modo Urbano, o motor fica limitado a pouco mais de 100 CV e os controles de freio, empinada e tração ficam quase 100% atuantes. É indicado especialmente para rodar na chuva.
Como anda
Bom, tudo isso é muito legal de ver e de ler, mas é preciso confirmar se tudo funciona. Foi isso que me foi proporcionado e justamente no palco sagrado da velocidade no Brasil, pista que conheço praticamente desde que nasci: Interlagos.
Nossa programação permitia três voltas na pista a cada turno e fiz questão de fazer dois turnos para extrair o máximo de informação. A primeira providência foi colocar no módulo Esportivo. O painel é uma peça linda, com tantas funções e informações que é preciso ler o manual até entender tudo. Para resumir, eu me fixei nas duas informações mais importantes: velocímetro e contagiros.
Logo ao me posicionar, lembrei imediatamente da primeira Monster que andei lá nos anos 90. Guidão largo, não se vê o farol, pés bem recuados, corpo para frente e braços abertos. Só não gostei da posição das pedaleiras, porque, do lado direito, o calcanhar fica pegando na curva do escapamento. Por outro lado, o sistema quick-shift do câmbio é uma delícia. Outro pênalti: o guidão esterça pouco, por isso calcule bem a curva, principalmente no meio do trânsito, senão vai ser um festival de espelhos arrancados.
Não tive a chance de rodar com garupa (ainda bem), nem no uso urbano (idem), foi só na pista mesmo e aproveitei para avaliar também os pneus Pirelli Super Corsa III, que ainda não conhecia pessoalmente. Primeira engatada, viseira abaixada… Fui!
Quem não conhece moto e música não consegue entender o alcance do ronco desses escapamentos. Os tubos são obras de arte no formato 2-1-2, com um som de arrepiar. E olha que é original e já na norma Euro 4 de emissões. Mínima vibração, menos do que na versão anterior, o que é louvável para um motor de dois cilindros. O comportamento do motor lembrou as esportivas Panigale: o motor sobe e desce de giro muito rápido. Coisa de ferver o sangue do testador.
Como já peguei a moto com pneus quentes, nem esperei meia volta para sentar o sabugo. Que coisa linda é o câmbio, que dispensa embreagem tanto para passar, quanto para reduzir. É só levantar e abaixar a alavanca que tudo se resolve. A potência é um soco no estômago, mas a entrega é bem linear, típico dos motores na configuração em L. A distribuição de potência e torque vem de forma muito suave, sem os sustos dos motores quatro-em-linha.
Quando senti que os pneus estavam mordendo com fome, comecei a deitar e deitar, como se estivesse de moto esportiva e, mesmo assim, não cheguei no limite dos pneus. Pode confiar cegamente nesses Diablitos, que não tem susto. O pneu traseiro passa o feeling do limite com bastante antecedência e precisão e o dianteiro só manda avisar que pode deitar à vontade.
Delícia também saber que se pode acelerar tudo no meio da curva que o controle de tração se encarrega de manter o piloto em cima da moto. O mesmo nas frenagens. Fiz o teste do sistema de freio na curva e. de fato, o efeito “stand-up” é menor, mas ainda dá para sentir que a moto quer levantar, devido à deformação do pneu dianteiro.
O mais impressionante foi no final da reta dos Boxes, na freada para o S do Senna. Nesse ponto a moto chegou a 242 km/h em sexta e aí precisei frear para 90 km/h em primeira marcha. Em uma moto normal, a frente afunda e a traseira chicoteia pra todo lado, mas o sistema eletrônico controla o mergulho da suspensão e ainda mantém a traseira alinhada. Aliás, o freio é simplesmente um ignorante de pai e mãe! Usei apenas um dedo no manete e ainda assim precisei controlar pra não frear demais.
Que a Monster era boa de curva e rápida eu já imaginava, porque não tinha como ser ruim. O que precisava avaliar era o que os italianos chamam de “erogabile”, ou seja, se a distribuição do motor é fluida. Para isso, esperei chegar na parte de subida, logo depois da curva da Junção. Coloquei em sexta e última marcha e deixei o motor cair a 2.000 RPM, então abri todo o acelerador e fui assim até a torre de cronometragem. Impressionante, porque o motor respondeu com vigor até chegar a 235 km/h, sem qualquer engasgo.
Depois de completar a volta, percebi que os motores modernos não precisam trabalhar com o giro lá nas alturas para uma tocada esportiva. É possível entrar com uma marcha acima do normal e sair da curva que nem um míssil, porque essa tecnologia toda empurra a moto sem precisar de rotações tão elevadas.
Só recomendo a instalação de uma pequena carenagem de farol (oferecida como acessório), pois o vento no capacete, acima de 200 km/h dá a impressão que vai arrancar a nossa cabeça do pescoço. Na minha eventual Monster, eu instalaria essa carenagem e ainda manteria para sempre a capa do banco monoposto. Aliás, outra coisa que não entendi: se tem a opção de transformar em monoposto, porque as pedaleiras do garupa não são removíveis?
Mais alguns itens destacáveis nessa Ducati: as suspensões Öhlins totalmente reguláveis. Na traseira, o monoamortecedor é fixado diretamente no cilindro vertical, usando o motor como estrutura portante. As rodas são novas e lindas com raios em Y.
Em suma, essa Monster 1200S chega para brigar diretamente com a Triumph Speed Triple na categoria naked esportiva. Posso garantir que é uma escolha difícil porque as duas são sensacionais, versáteis e muito divertidas. A Ducati apresenta um pacote mais completo, mas vai muito do gosto pessoal. Que seja lançado o desafio!
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Por Tite Simões – Jornalista e instrutor de pilotagem dos cursos SpeedMaster e ABTRANS. Contato pelo tite@speedmaster.com.br
Fotos: divulgação Ducati
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