Para quem é doente por automóveis e esporte a motor, não existe programa mais legal que o Festival de Velocidade de Goodwood. Evento que acontece há 25 anos no interior da Inglaterra e que reúne tudo que corre sobre rodas. Este ano, o festival, que completou seu jubileu de prata, serviu de palco para exibições de carros incríveis como o Brabham BT62, um hipercarro que chega para disputar terreno com McLaren Senna (que também “desfilou” por lá) e demais modelos exóticos.
Mas o que chamou minha atenção nesta edição foi uma sequência de vídeos publicados na página oficinal do evento no Facebook. Os filmes que fizeram um resumo da festa valem a pena ser assistidos. Basta dar uma busca com a hashtag #FOA. E, dando uma navegada pela fanpage, logo apareceu a performance assustadora do Volkswagen I.D. R Pikes Peak, pilotado pelo francês Romain Dumas, na famosa subida de rampa de Goodwood.
Dumas, que há poucas semanas tinha quebrado o recorde da subida de montanha de Pikes Peak com insano tempo de 7m57.1s, também esmagou o recorde no desafio inglês, com o tempo de 43.8 segundos. A prova de Goodwood está longe de ser tão perigosa quanto Pikes Peak. Seu traçado curto e de leve inclinação não assusta, mas não é fácil.
Trata-se de uma pista estreita, cheia de curvas e setores ladeados por muros de pedra. Nela correram de tudo. Desde de o cortador de grama infernal da Honda a até o carro de Dumas, passando por bólidos de competição de todas as eras e categorias. Daí é preciso andar muito rápido.
O tempo de Dumas demorará a ser vencido. O I.D R foi desenvolvido justamente para subir Pikes Peak, que supera 4 mil metros de altitude, ventos fortíssimos e um traçado de 20 quilômetros que serpenteia montanha acima, uma pista estreita em que a área de escape é o precipício. Sua carenagem foi desenhada para mantê-lo junto ao chão e altas velocidades, seus dois motores elétricos que somam quase 700 cv são suficientes para dar muita aceleração à leve carroceria. Goodwood foi como um passeio de mãos dadas com a namorada numa manhã de sol.
Mas a performance de Dumas foi marcada pelo silêncio de seu carro do futuro, que não queima uma gota de gasolina. Silêncio que foi rompido, no vídeo seguinte, por um monstro de 50 anos. Alguém de muita coragem e nem um pingo de juízo levou para a rampa um Shelby Daytona Coupé. Trata-se de um carro que apenas seis exemplares feitos por Carrol Shelby. Outras 50 foram anunciadas pela Shelby Cars em 2015. A unidade que foi para Goodwood é uma das originais, fabricada entre 1964 e 1965.
O Daytona foi a derivação aerodinâmica do Cobra. Sua carroceria fechada lhe dá um comportamento dinâmico que era impensável ao intempestivo Cobra. Mas em Goodwood, não foi a precisão nas curvas que chamou atenção. Muito pelo contrário. O Daytona se mostrou indócil, soltando a traseira em quase todas as curvas, inclusive na seção final, entre os muros de pedra.
Para um carro avaliado em 25 milhões de libras, que dá quase R$ 126 milhões, é preciso ter gelo nas veias para colocá-lo à prova. O que não pareceu problema para o ex-piloto sueco, Kenny Bräck, que segurou o Daytona com as unhas.
Mas o que chamou a atenção foi o ronco furioso do 289 V8 (4.7 litros) Ford que deixou um rastro grave e áspero pela pequena pista de quase 2 quilômetros.
São dois comportamentos antagônicos na mesma pista. O I.D. R é um carro cirúrgico, feito para obter a melhor performance. É um laboratório sobre rodas. O Daytona foi um carro feito para dar ao Cobra a capacidade de completar corridas.
São máquinas muito diferentes, com tecnologias diferentes, de eras diferentes e comportamentos diferentes. Mas, que reafirmam que o automóvel é uma máquina maravilhosa, seja no silêncio ou em plenos pulmões.
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Marcelo Iglesias Ramos é Jornalista e Designer Gráfico.
Está na área desde 2003, atualmente é o editor do caderno HD Auto, do jornal Hoje em Dia, de Belo Horizonte. Figura presente em todos os lançamentos, salões do automóvel e eventos da indústria automobilística. Para relaxar, tem como hobby escrever para seu blog de games, o “GameCoin” (www.gamecoin.com.br).
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