A ameaça da General Motors em deixar o mercado latino americano, diga-se o Brasil, é um daqueles melancólicos atos de chantagem, que costumamos a assistir na indústria automotiva. O recente comunicado enviado aos funcionários da marca, pouco depois de um anúncio bilionário de investimentos, é um tanto contraditório. Mas, ao mesmo tempo, é compreensível e faz parte do jogo da indústria de carros no Brasil.
No período eleitoral, rumores de que uma derrota de Jair Bolsonaro (PSL) nas urnas poderia ser o ponto final das atividades da Ford no país é um desses ensaios. Assim como os alertas de demissões maciças devido à ameaça chinesa, lá no início da década, que acabou se traduzindo no protecionista Inovar Auto. São blefes numa mesa em que o crupiê não tem o menor controle sobre as cartas. A GM não vai embora.
Cortes
O que a GM quer, assim como desejou a Ford e também quiseram, há seis anos, todos os fabricantes instalados, é obter formas de reduzir seus gastos de produção. Seja com pessoal, tributos e aquisição de insumos, assim como angariar incentivos fiscais.
Em seu recado aos funcionários, a gigante de Detroit deixa claro que se faz necessário um comprometimento do governo, concessionários, funcionários, fornecedores e sindicatos para a manutenção da GM na região. E se traduz em redução de custos. Olhando por esse ponto, há quem considere um ponto final na fábrica de São Caetano do Sul. Analistas do setor apontam que a unidade quase centenária é um peso nas operações do grupo.
Reformas
Outro apontamento é forçar o governo federal a dar sequência às reformas trabalhistas. A GM, como toda a indústria, sabe quanto pesam os encargos e demais custos trabalhistas em suas contas. As mudanças começariam pela unidade São José dos Campos, onde seria adotada a terceirização e jornada intermitente.
Isso significa implementar novas jornadas de trabalho de 44 horas semanais, assim como a redução do piso salarial. Segundo a Folha de S. Paulo, em reunião realizada no dia 22 entre a GM e sindicalistas, um dos 28 pontos debatidos era a redução do piso de R$ 2.300 para R$ 1.600.
Apesar de GM não comentar sobre o comunicado enviado aos funcionários e nem sobre a pauta da reunião com os sindicalistas, os participantes revelaram que é necessário que São Caetano e São José dos Campos “colaborem”.
De acordo com a reportagem, ela também quer reduzir o percentual do adicional noturno de 30% para 20% sobre a hora de trabalho. Ela também busca implantar a jornada 12 por 36 horas, que já está prevista na nova lei trabalhista.
Ainda segundo a Folha, ela ainda negocia o congelamento dos salários e também a suspensão da Participação nos Lucros e Resultados (PLR). Já no tocante aos concessionários, a GM espera reduzir as comissões de vendas de 5 para 4%. E na mesma toada ela também busca renegociar com fornecedores.
Futuro próximo
Enquanto as unidades paulistas estão na alça de mira dos executivos da GM, as fábricas de Gravataí (RS) e Joinville (SC) são protagonistas na nova fase da empresa. Da unidade gaúcha sairão as novas gerações de Onix e Prisma, enquanto a nova família de motores, que equiparão esses modelos, será fabricada em Santa Catarina.
Apesar de ser líder de vendas por aqui há três anos, a GM afirma que suas operações não têm dado o retorno esperado. “Não vamos continuar investindo para perder dinheiro”, afirmou a CEO global da GM, Mary Barra.
Um dos argumentos é que seus modelos de maior volume figuram nos segmentos de entrada, com menor rentabilidade. O estranho é que as marcas que detêm a maior participação do mercado também fazem seu volume com modelos da prateleira debaixo Fiat, Volks, Ford e Hyundai também vivem esse dilema.
Pelo menos as três mais antigas também convivem com fábricas imensas e que não oferecem a mesma eficiência e rentabilidade das modernas e compactas fábricas da atualidade. Mesmo assim, estamos falando de carros que orbitam numa faixa de preços entre R$ 40 mil e R$ 80 mil.
Assim como um mais um são dois, é garantido que GM não vai embora. Ela pode até deixar o interior paulista num momento oportuno para se concentrar em suas modernas instalações no Sul do país e com relações sindicais mais harmoniosas. Mas não vai deixar o mercado brasileiro, não depois de emplacar quase meio milhão de unidades, como foi em 2018.
E vida que segue.
Marcelo Jabulas é Jornalista e Designer Gráfico.
Está na área desde 2003, atualmente é o editor do caderno HD Auto, do jornal Hoje em Dia, de Belo Horizonte. Figura presente em todos os lançamentos, salões do automóvel e eventos da indústria automobilística. Para relaxar, tem como hobby escrever para seu blog de games, o “GameCoin” (www.gamecoin.com.br).
Ver comentários (2)
Muito bom o texto! Nem precisou aprofundar o debate (ex: Custo Brasil, que adoram argumentar com isso; e sobre o lucro daqui ir cobrir as despesas na Europa; investimentos virem através do BNDES; qualidade dos produtos, etc)... Seria bom saber qto ganham os trabalhadores e o qto são valorizados, ao ir comprar um veículo. Tenho acordo com comentário do José tbm!
Abraços
Ela nos faria enorme favor. Seu espaço seria facilmente ocupado por uma CAOA da vida e nos veríamos livres de uma grande chantagista, produtora de veículos ruins, inseguros, desconfortáveis, caros, etc., etc. Já vai tarde! Bobo do governo de SP que, parece, vai abrir as pernas (o federal, parece, vai negar o pleito da GM). Bestas serão os sindicatos. Muitos anos atrás - uns 40 -- o já falecido José Pastore fez uma pesquisa que mostrava que os salários e encargos somavam 22% do preço dos automóveis da época. Anos depois, outra pesquisa mostrou que já estava abaixo de 10%. Hoje, duvide-ó que não esteja nuns 8%. E os caras querem cortar... Ah, quer saber, vão coçar macaco!